Celebração aos 18 anos do Sorriso de Plantão
“O mundo é salvo todos os dias por pequenos gestos. Diminutos, invisíveis. O mundo é salvo pelo avesso da importância. Pelo antônimo da evidência. O mundo é salvo por um olhar. Pelo antônimo da evidência. O mundo é salvo por um olhar. Que envolve e afaga. Abarca. Resgata. Reconhece. Salva. Inclui.”
Eliane Brum
Em um mundo em que cada vez mais os indivíduos possuem dificuldade em enxergar e escutar o outro, deslocar-se de seu espaço comum e diário, travestir-se numa personagem é um ato que promove variadas reflexões, como, por exemplo: “quais os efeitos de nossa existência nas vidas das pessoas que nos atravessam?”. Será que um dia saberemos essa resposta, ou a veremos? É, como já disse Caetano Veloso em sua “Oração ao tempo”, “tempo, tempo, tempo, tempo, compositor de destinos”. Como um ser “lindo” e “inventivo”, o tempo oferece novos olhares para rever vivências contínuas. Cruzar certas linhas da idade cronológica, principalmente, 18 anos, a dita “maior idade”, incita observar o passado, celebrar o presente e traçar mais horizontes para o futuro.
Em dezoito anos de caminhada, o Projeto de Extensão Sorriso de Plantão (Uncisal/Ufal) entrou na vida de estudantes universitários, profissionais da área da Saúde, de Serviços Gerais, de crianças, adultos e acompanhantes. Os sorrisos construídos conjuntamente são incontáveis, pois, multiplicaram-se para fora dos Hospitais que atuamos. Laços de família foram formados durante esses anos na interação entre os palhaços doutores. Não é à toa que nos referimos um ao outro como irmãos e irmãs, não é mesmo? Por meio dessas afinidades, do amor que nutrimos pelos membros de nossa família, é que viajamos tanto de Trem nesses últimos anos. Muitos desenhos ganharam cor, rostinhos deixaram a tristeza de lado e abriram-se para a alegria, motivando-nos a aprimorar, paulatinamente, o nosso trabalho. A responsabilidade da maioridade nos fortalece, uma vez que o compromisso com a palhaçoterapia e a ludoterapia mostra que estamos “envelhecendo” bem. Com a chegada dessa nova idade, mesmo em um momento social que não nos inspira comemoração de nenhum caráter, precisamos expressar a nossa gratidão a todos que caminharam conosco até agora.
Uma família composta por centenas de pessoas, como o Sorriso de Plantão, só poderia viver em paz ao comando de uma grande mãe, que tivesse um coração muito grande para acolher todos. Felizmente, nós, palhaços doutores, fomos agraciados pela infinita maternidade da Dra. Florzinha Jardins, a tão querida e amada Maria Rosa. A sua dedicação integral para manter as engrenagens do nosso Trem funcionando é admirável, bem como o seu cuidado, carinho e atenção com as crianças e adultos que estão conosco durante as tardes de sábado. A Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal) e a Universidade Federal de Alagoas (Ufal) são as nossas estações de morada quando não estamos no Trem, e, sem o apoio dessas Instituições, não conseguiríamos ter chegado até aqui. Somos muito gratos a todo o apoio que nos foi dado ao longo dessa trajetória de dezoito anos.
A vida se encarregou também de nos enviar alguns seres iluminados que, durante as capacitações de formação de palhaço doutor, tornaram-se nossos amigos e nos ajudaram a construir as nossas personagens e a resgatar as crianças que estavam, por vezes, adormecidas dentro de nós. Gratidão ao Professor de Música Jâneo Amorim, que mostrou caminhos, nos últimos anos, para sentir a batida dos sons e levar ritmos para os hospitais. A sua fofura, paciência e amor pelo que faz encanta e nos transforma em seres mais musicais. Gratidão em ter ao nosso lado a Professora Maria Helena Rosa, que teve a missão de apresentar as formas de abordagem do brincar com a criança, apontando as variadas distinções de interação no contexto da mudança de faixa etária. Gratidão à Professora Fernanda Monteiro, que com o seu bom humor inquestionável e piadas cuidadosas, nos fez enfrentar a morte no dia a dia do Hospital sob outra perspectiva. Ela nos confortou e desvelou que há muitas experiências, além das lágrimas e de luto, no vivenciar de uma perda.
Para quem nos acompanha, sabe o quão é importante o registro fotográfico de nossas festas e dos instantes singulares que vivemos com os pacientes. Para essa eternização de momentos por intermédio de imagens, contamos com as lentes da fotógrafa Cristiane Lira, que faz da sua câmera um instrumento de registro do amor mais sincero, doce e puro que pode existir nesse mundo: o sorriso de uma criança. Falando em festa, temos uma personagem pra lá de especial, que nos visita todo mês de dezembro: o Papai Noel! Somos tão chiques que até o bom velhinho sempre faz questão de nos ver no Natal, ajudando-nos a presentar as nossas crianças. Cabe ao Professor Manoel Pinto encarnar essa figura e levar a esperança para essas crianças que estão longe da família, mas que precisam sentir o conforto de um lar. Por favor, continue nos visitando, Papai Noel, pois a sua presença espalha muita felicidade. E um obrigado também ao Professor Claudio Soriano por nos acompanhar até hoje.
Por fim, é preciso voltar para as nossas raízes e agradecer à Médica Karine Ferreira e ao seu grupo de amigos e amigas por terem idealizado esse projeto, com base na experiência dos Doutores da Alegria em São Paulo. Vocês plantaram e cultivaram a semente que hoje germina no coração de tantas pessoas. Durante essa jornada, uma reunião específica tem sido essencial para a nossa contínua formação: o Encontro Nacional dos Palhaços que Atuam em Hospitais, promovido pelos Doutores da Alegria. Esbarramos em muita gente bacana, que instigou criatividade, força e perseverança para continuarmos prosseguindo.
É, isso, pessoal, somos “de maior” agora e a responsabilidade redobra. Esperamos que o mundo possa se tornar mais leve por meio dos sorrisos, mais empático através de um olhar que acolhe, menos violento ao usar as palavras como um meio de resgatar o outro, de aproximar-se dele, e não de afastá-lo. No momento, as estações físicas de paragem do nosso Trem estão interditadas, mas, contamos com outras: vocês! Cada palhaço doutor, cada acompanhante, cada criança e adulto que atendemos, cada trabalhador das equipes dos Hospitais que atuamos e cada colaborador/amigo que está ao nosso lado possui uma estação especial que nunca será interrompida e que estará sempre pulsando, independentemente do quão cruel o mundo possa ser. Estamos agora na Estação Número 1 do nosso Trem: o Coração.