O fundamento filosófico do Sorriso de Plantão: um sopro de vida no seu coração
Era uma tarde ensolarada de sábado, 08 de outubro de 2011 e, no Hospital Universitário, um palhaço doutor conseguiu uma autorização para soltar pipa com uma das crianças hospitalizadas. Desceram o elevador, inclusive, com o suporte do soro. Logo depois, a pipa enganchou numa das árvores do estacionamento e ambos tiveram que voltar para o leito. Mas, a criança ficou feliz. Em seguida, o palhaço e sua turma subiu para ala dos adultos. Quarto andar. Era por volta das 15h30min da tarde. Lavaram as mãos, novamente, e foram visitando leito por leito, como de costume. No penúltimo, do lado de esquerdo, um dos integrantes, o mais apressado, foi na frente e entrou primeiro. Na primeira cama, do lado esquerdo, encostado na parede, havia um senhor, de oitenta anos de idade, cabisbaixo, coçando a cabeça, como que refletindo, com pesar, sobre algo de sua vida. O palhaço colocou o rosto na sala e não disse nada, simples e espontaneamente adentrou no ambiente. O velho, de logo, se espantou. Levantou a cabeça, arregalou os olhos e ficou meio sem entender. Naquele momento, o peso do pensar se diluiu diante de um sorriso que costumava estar de plantão toda semana nos hospitais, mesmo que a recomendação fosse de comparecer apenas quinzenalmente. Voltamos à cena, pois nela repousa o fundamento filosófico do Sorriso de Plantão. Talvez, aquele senhor estivesse pensando sobre sua doença, sobre o que tinha deixado lá fora do hospital, se ficaria curado e voltaria para casa ou se morreria em breve. Seu olhar, a princípio, era longínquo e triste. Mas, parece que quando o Palhaço – cheio de cores e expressando juventude e recordando a vida, sempre pulsante – adentrou no local, o velho mudou. É que sopraram algo dentro daquele leito! Minutos depois, a turma chegou junto. Brincaram, sorriram e cantaram a música mais pedida de todos os sábados: não posso ficar nem mais um minuto com você... Em instantes, o ser humano, outrora macambúzio, parecia ser outra criatura. Pois bem, foi desse fato verídico que se extraiu a frase Sorriso de Plantão: um sopro de vida no seu coração. De início, se nota que a frase não é uma criação do autor, mas a descrição de um fato. Não se trata de ideia, pois é ciência. Nada tem a ver com suposição, é relato bruto, vivo e experienciado. Constitui, na verdade, a síntese filosófica do Projeto de Extensão. A partir da frase, uma filosofia se constrói com suas respectivas idiossincrasias. Mas, por quê? Explica-se. Em primeiro lugar, é preciso esclarecer que o verbo soprar, aqui, etimologicamente, tem a ver com inspirar. Inspirar é soprar em, mais especificamente insinuar algo no coração. Com isto, quer-se dizer que, no âmago desse verbo, se encontra o seguinte conteúdo: quando se sopra, deseja-se sempre alcançar o coração. E o que seria alcançar o coração, senão dar o coração, dar vida em favor de outrem? No antigo testamento, Deus, ao criar o homem, soprou em suas narinas e dali o homem ganhou a vida. Por isso, diz a letra da música: tua vida é um sopro de Deus... Nesse cenário, pode-se verificar que o fundamento filosófico do Sorriso de Plantão é soprar vida no coração do outro, especialmente do paciente, o qual, por vezes, se vê diante da morte. O que fez aquele palhaço doutor, juntamente com seus companheiros? Ele soprou vida no coração daquele ancião. Ele recordou para aquele homem, inicialmente, pesaroso, que ainda havia vida dentro dele ou que se ela estava apagada, naquele momento estava por ser renovada, ou melhor, soprada mais uma vez em seu interior. O Sorriso de Plantão, portanto, recorda a vida. Aquilo que era um projeto de extensão e depois se tornou um sentimento que não pode parar tem por finalidade relembrar para as pessoas os valores, atividades e atitudes que são inerentes à vida, tal como a música. Cantar para o velho, naquele dia, recordou a ele a vida dele próprio, o fez inflar os pulmões não para respirar de forma triste, mas colocar para fora a poesia que existia dentro dele. O Sorriso recorda a vida! Mas, mais que isso. Sopra. Há, também, algo divino, metafísico, místico, incomum ou qualquer coisa do gênero que o valha nessa função desempenhada pelo Projeto. Mas, de toda sorte, nos limites científicos, pode-se dizer que, filosoficamente, o Sorriso de Plantão ajuda a rememorar o cerne do existir do paciente, sua vida. É para isso que serve o Projeto, de maneira que, se um dia ele perder esse valor, terá perdido sua própria essência. Por outro lado, enquanto soprar a vida no coração do outro, estará fazendo aquilo que foi criado para fazer. E mais: se um dia perder o sentido ou estiver em dúvida do é chamado a ser, poderá se voltar ao fundamento filosófico que lhe é congênito para se reencontrar. Soprar no coração do ser humano, fazendo ele recordar que há uma vida pulsante, vigorosa, forte, presente e verdadeira, dentro dele é o objetivo desse Projeto de Extensão. Tudo isso representa o fundamento filosófico ou aquilo que a ciência chama de ratio essendi (a razão de ser) de algo. Assim, esse texto finda, com tal arremate, Sorriso de Plantão: um sopro de vida no seu coração.
Att.
Dr. Apressadinho da Silva