Redefinindo o conceito de cuidado: a palhaçoterapia na formação médica
Medicina, terapia do riso, hospitalização, arte. Essas são as palavras-chaves do relato de experiência de Pedro Braz de Lucena Neto, ex-membro do Sorriso de Plantão e médico pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Com o tema “A palhaçoterapia na formação médica - relato de experiência no contexto da hospitalização infantil”, o artigo discute a abordagem prática, por um estudante de medicina, dos conceitos de humanização e de integralidade do cuidado por meio da arte do palhaço. Leia na íntegra aqui.
“Um dos grandes atributos essenciais a qualquer profissional da saúde é a empatia. Compartilhar e compreender o sentimento do próximo torna-se base de qualquer relação interpessoal, em destaque quando somos mediadores da dor, da apreensão e da angústia do paciente”, afirmou Pedro, sobre a importância de um olhar humanizado no ambiente hospitalar, sobretudo durante a crise de saúde pública da COVID-19.
O trabalho foi publicado pela revista Health and Society Portal Journal da Faculdade de Medicina da UFAL - 1ª edição de 2020. Pedro concluiu sua graduação em 2019 e participou do projeto no ciclo de 2017-2018, dando vida ao Dr. Focinho nos plantões de sábado da Clínica Infantil Daisy Brêda - um dos seis hospitais atendidos pelo Sorriso de Plantão.
Baseado em três depoimentos pessoais, o artigo ilustra os impactos na construção de um profissional mais humanizado pela experiência vivenciada no projeto. Há o estímulo de uma visão altruísta quando, semanalmente, o estudante veste um jaleco colorido e encarna um personagem lúdico para aproximar-se do paciente, compreender seu sofrimento e amenizá-lo com companhia, risos e esperança. Um dos depoimentos é a história do personagem, segue o trecho:
“Filho da Dona Canina e do Sr. Ossinho, todos os sábados embarco no trem do Sorriso de Plantão, distribuindo carinho e lealdade às crianças enfermas. Em minha mala, sempre carrego os ingredientes mágicos da alegria: a paz, o companheirismo, o amor e a solidariedade”
O palhaço-doutor torna a figura do médico mais acessível e transforma positivamente a internação hospitalar. Processo que é considerado, por vezes, traumático e prejudicial ao desenvolvimento tanto psicológico quanto cognitivo do paciente - sobretudo a criança. Nesse sentido, o surgimento da palhaçaria nas enfermarias se expande do entretenimento para se configurar como pilar fundamental nas equipes multidisciplinares de saúde. Questão que Pedro aborda em sua pesquisa:
“Palhaços doutores, como são conhecidos em sua maioria, têm por objetivo a redução do medo, do estresse, do desamparo e da ansiedade no ambiente hospitalar, participando ativamente na evolução da cura e da reabilitação do paciente”.
Com a orientação de Maria Rosa da Silva, coordenadora do Sorriso de Plantão, o trabalho propõe uma revisão da intervenção dos profissionais da saúde no universo infantil e aponta, como alternativa, o contato com a palhaçoterapia na graduação. Desmistificando a cultura médica atual que tem o cuidado como algo mecânico e protocolar. O Sorriso de Plantão é um grande incentivador da produção científica sobre os benefícios da ludoterapia no âmbito da saúde:
“Decidi relatar a experiência adquirida ao longo do projeto com o intuito de compartilhar a minha superação ao longo dos plantões, desde o desafio na construção de uma nova identidade, até o simples fato de despedir-se de um paciente” ressaltou Pedro que, logo após o término da residência, começou a trabalhar em serviços de urgência e emergência.
“Um dos grandes desafios de um médico emergencista é lidar com as perdas constantes, a comunicação de más notícias e a rápida tomada de decisões. Diante de um ano de incertezas, fazer parte de um projeto com o Sorriso de Plantão que trabalha o altruísmo, mergulhando nas tênues linhas do olhar da criança, promove transformações permanentes refletidas na futura atuação do indivíduo nos serviços de saúde.” salientou o irmão gêmeo do palhaço Dr. Focinho.
Em agradecimento, Braz revelou a nostalgia de relembrar os plantões com seu jaleco de ossos coloridos: “Não esquecerei cada detalhe do Dr. Focinho - sua história, lágrimas proporcionadas e abraços conquistados. Mesmo diante da timidez inicial, fazer parte do Sorriso de Plantão foi uma grande conquista. Tenho certeza que o Dr. Focinho ainda fará parte de grandes aventuras, seja ao longo do meu caminho na neurocirurgia ou nos universos por ele sempre explorados”.